quinta-feira, 16 de agosto de 2012


Saiba que todas as coisas são assim:

Uma miragem, um castelo de nuvens,

Um sonho, uma aparição,

Sem essência mas com qualidades que podem ser vistas.

Saiba que todas as coisas são assim:

Como a lua num céu brilhante

Em algum claro lago refletida,

Ainda que para aquele lago a lua jamais se moveu.

Saiba que todas as coisas são assim:

Como um eco que provém

Da música, sons, e lamentos,

Embora nesse eco não haja melodia.

Saiba que todas as coisas são assim:

Como um mágico que fabrica ilusões

De cavalos, bois, carroças e outras coisas,

Nada é como parece.  (Buda)

sexta-feira, 13 de abril de 2012

AQUARELA

Em 1987 fui fazer um curso no MAC Ibirapuera que tinha o título "O Fazer Artístico". O curso foi ministrado por John Swift, diretor da Universidade de Cambridge e a técnica utilizada foi a aquarela. O curso durou 5 dias e a cada dia era trabalhado um tema a respeito do Valor da Imitação. Tudo foi inovador. A minha geração passou por uma mudança brusca onde as aulas de arte deixaram de valorizar a cópia, os desenhos "mimeografados" e passarm a ser aulas livres.
Toda mudança radical necessita de um tempo para ser assimilada e encontrar um equilíbrio. Como podemos ser livres para criar sem noção do que e de como fazer? Não podíamos usar borracha mas também não sabíamos olhar... a base do desenho é a investigação sensorial, visual, tátil. Para algumas pessoas é angustiante demais o fato de ouvir ao comando "faça um trabalho livre". Não há nada mais intimidador, paralizador do que isso. Bem, o fato é que John Swift ao falar a respeito do valor da imitação abriu um portal enorme de possibilidades e valoriação para a criatividade.
Hoje falar a respeito de citação, referência a um artista, releitura é comum; mas não ´década de 70, 80 isso não era possível. Em 1987 eu já estava formada em artes plásticas e fazia pós graduação em História da Arte, no mesmo ano fiz curso com Nuno Ramos e Paulo Monteiro também no MAC. Eu adorava experimentar materiais, criar, não me prendia a conceitos externos quando produzia um trabalho expressivo; eu gostava mesmo era da liberdade de me expressar de acordo com a minha necessidade interior (e ainda gosto).
Por isso, ao ouvir falar sobre imitação consciente e inconsciente, sobre memórias inconscientes que se revelavam em uma pintura fiquei encantada.
Uma das atividades foi buscar na memória a nossa própria imagem e registrá-la em aquarela. O resultado foi esse abaixo:

Para minha surpresa o professor perguntou-me se eu era aquarelista! Não, eu nunca havia pintado uma aquarela até aquele dia porém, aquele comentário me insentivou a ponto de me fazer nunca mais parar de aquarelar qualquer pedacinho de papel que encontro. Obrigada John Swift.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

ENSAIO SOBRE SAPATO

Gosto de andar pelas ruas e fotografar ou pegar sapatos encontrados; geralmente um pé só, sem dono, sem o pe´. Por onde anda o pé deste sapato? Há 10 anos me ocupo disso...
Tudo começou numa madrugada no Bexiga, madrugada paulistana, garoa e alguns amigos já meio embreagados, a risada rolava solta. Como eu não bebo me divirto com as histórias. Então a essa altura, umas 2h da madrugada, olhei para o chão e havia uma cena mágica: um sapato abandonado com a sola aberta, a garoa caindo e a luz do poste refletindo sobre ele. Olhei aquela imagem e disse "olha que maravilha! Que poético!". Sem hesitar peguei aquele sapato abandonado pensando em fazer uma instalação com ele. Todos pararam, começaram a rir e comentar "ainda bem que ela não bebe, rsssss". Tudo bem, eu continuo até hoje encantada com cada sapato que encontro abandonado na rua- e são vários...
Essa foto é uma experiência desta pesquisa e, por coincidência, também encontrado numa madrugada no Bexiga agora recentemente.




 ...

Olha o sapato no chão
onde andará esse pé...
no céu o brilho da noite
a rua cheia de bar
o pé, o chão.
o sapato na rua,
o olho na lua.
                              Claudia Colagrande

domingo, 1 de abril de 2012

DESDOENDO

Uma amiga do FB publicou uma palavra muito interessante "desdoendo"! Ana Cristina Martins me inspirou tanto com esta palavra que há 3 dias me pus a pensar nos "des" da vida; e são muitos, e tantos como : descolagem, despertar, despontar, despejar, desapego, deslocado, desencorajar, destoar, desbotar, desavesso, enfim poderia passar horas aqui buscando palavras desafiando o desejo de encontra-las. Mas desdoendo... essa eu nunca havia ouvido, lido nem pensado. E foi por isso que fiquei instigada a escrever algo que desconstruisse o pensamento mecânico de repetir palavras já prontas, tentando brincar com as palavras usando-as de forma criativa. O que surgiu deste ensaio reflexivo foi o seguinte:   

Procuro desfalar e desver
Despercorrendo o descaminho
Iniciando o despercurso
Lentamente desdoendo...
Claudia Colagrande, outono 2012

O que foi arrebatador foi a motivação que me levou a encontrar palavras que pudessem fazer sentido onde não há. Como o caminho que nunca foi percorrido, o sonho que nunca foi sonhado, a emoção que ainda não foi descoberta. Assim vou tecendo a vida buscando dar um dessentido a ela já que muitas vezes parece não haver nenhum. Desdoendo é muito bom! Ainda não é sem dor mas o desejo do por vir.
E vou desdomingando com a foto da Nina que clicou a pomba desvoando, boa noite!

segunda-feira, 12 de março de 2012

Pinacoteca do Estado de São Paulo


Pinacoteca do Estado de São Paulo, na Estação da Luz é um referência da arquitetura dessa cidade. Em 1984 entrei na Faculdade de Belas Artes de São Paulo pois meu sonho era estudar neste lugar pois a Belas Artes tinha como cede esse prédio. Só prestei vestibular na Belas Artes. Por ironia do destino, ao passar no vestibular, soube que a minha turma seria a primeira a iniciar o curso no novo prédio, na Vila Mariana onde situa-se a Belas Artes até hoje. Fiquei muito triste porém, o curso de arquitetura continuou na Pinacoteca até 1989 e então eu fiz o curso de Artes Plásticas como aluna regular (na Vila Mariana) e Arquitetura como aluna ouvinte no prédio da Pinacoteca...
Ontem passamos o dia andando por São Paulo e fotografando a cidade... a Pinacoteca continua causando o mesmo impacto em meu ser embora hoje esteja muito mais bem cuidada!

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Caderno de Artista

O Caderno de Artista é um veiculo de reflexão que o artista utiliza para utilização de seu processo criativo, critico. Esse meio ajuda a organizar as idéias, fazer estudos de imagens, desconstrui-las se necessário e perceber o amadurecimento da linguagem. Considerando que essas experiências para cada um se da de maneira única, a elaboração desse processo torna-se uma referência para o próprio artista. A observação dessa prática revela uma história imagética. Sempre gostei de escrever, pintar e desenhar e os cadernos sempre fizeram parte de minha vida. Quando percebi havia uma coleção deles... as vezes pego um e fico explorando através do olhar, percebendo sinais das linhas, cores e gestos que criaram uma marca. Aquarelas, colagens e linhas indefinidas fazem parte desses registros.
Amo meus cadernos e acho que são eles quem mais me revelam pois na intimidade de minha criação, sem pretenções de criar uma obra são eles que a conservam em sua forma original e pura. Os erros (?), as tentativas, os acertos (?), está tudo contido lá. Sem reparos, sem mascaras, apenas existindo de maneira original na explosão de cada momento.

Desconstrução da Imagem


Na 2a feira de carnaval acordei no meio da noite e liguei a TV para ver se havia algo de interessante. Passando pela TV Cultura havia uma imagem no centro do Roda Viva que me chamou a atenção; por um momento fiquei tentando buscar referências para aquilo que meus olham miravam. Não havia. Era Laerte Coutinho, um cartunista muito inteligente, vestido de mulher, maquiado, cabelos longos e unhas pintadas de vermelho. Em seus olhos havia uma verdade absoluta e em sua fala algo que ultrapassava conceitos e pre-conceitos. As outras personalidades que o entrevistavam eram todas pessoas também muito interessantes e, ao final do programa ja não importava se era um homem, uma mulher e sim, um ser humano genial!
Desde esse dia essa imagem ficou em minha mente. As imagens costumam falar mais do que as palavras quando prestamos atenção a elas. Sempre trabalhei com a desconstrução de imagens; desenhos realistas nunca foram meu foco, meu interesse pois as coisas são as coisas. A arte para mim tem outra função. A de ultrapassar a superficialidade e causar estranhamento, questionamento, nos fazer sair do lugar de conforto para um lugar de reflexão. Os rótulos surgem quando fixamos apenas na aparência das coisas mas, se ousarmos buscar uma essência então algo pode se revelar. A percepção da sensação que a imagem nos causa é o que conta. Então, citando George Braque: "A ciência tranquiliza e a arte perturba".
Obrigada Laerte por causar essa profunda perturbação.