sexta-feira, 13 de abril de 2012

AQUARELA

Em 1987 fui fazer um curso no MAC Ibirapuera que tinha o título "O Fazer Artístico". O curso foi ministrado por John Swift, diretor da Universidade de Cambridge e a técnica utilizada foi a aquarela. O curso durou 5 dias e a cada dia era trabalhado um tema a respeito do Valor da Imitação. Tudo foi inovador. A minha geração passou por uma mudança brusca onde as aulas de arte deixaram de valorizar a cópia, os desenhos "mimeografados" e passarm a ser aulas livres.
Toda mudança radical necessita de um tempo para ser assimilada e encontrar um equilíbrio. Como podemos ser livres para criar sem noção do que e de como fazer? Não podíamos usar borracha mas também não sabíamos olhar... a base do desenho é a investigação sensorial, visual, tátil. Para algumas pessoas é angustiante demais o fato de ouvir ao comando "faça um trabalho livre". Não há nada mais intimidador, paralizador do que isso. Bem, o fato é que John Swift ao falar a respeito do valor da imitação abriu um portal enorme de possibilidades e valoriação para a criatividade.
Hoje falar a respeito de citação, referência a um artista, releitura é comum; mas não ´década de 70, 80 isso não era possível. Em 1987 eu já estava formada em artes plásticas e fazia pós graduação em História da Arte, no mesmo ano fiz curso com Nuno Ramos e Paulo Monteiro também no MAC. Eu adorava experimentar materiais, criar, não me prendia a conceitos externos quando produzia um trabalho expressivo; eu gostava mesmo era da liberdade de me expressar de acordo com a minha necessidade interior (e ainda gosto).
Por isso, ao ouvir falar sobre imitação consciente e inconsciente, sobre memórias inconscientes que se revelavam em uma pintura fiquei encantada.
Uma das atividades foi buscar na memória a nossa própria imagem e registrá-la em aquarela. O resultado foi esse abaixo:

Para minha surpresa o professor perguntou-me se eu era aquarelista! Não, eu nunca havia pintado uma aquarela até aquele dia porém, aquele comentário me insentivou a ponto de me fazer nunca mais parar de aquarelar qualquer pedacinho de papel que encontro. Obrigada John Swift.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

ENSAIO SOBRE SAPATO

Gosto de andar pelas ruas e fotografar ou pegar sapatos encontrados; geralmente um pé só, sem dono, sem o pe´. Por onde anda o pé deste sapato? Há 10 anos me ocupo disso...
Tudo começou numa madrugada no Bexiga, madrugada paulistana, garoa e alguns amigos já meio embreagados, a risada rolava solta. Como eu não bebo me divirto com as histórias. Então a essa altura, umas 2h da madrugada, olhei para o chão e havia uma cena mágica: um sapato abandonado com a sola aberta, a garoa caindo e a luz do poste refletindo sobre ele. Olhei aquela imagem e disse "olha que maravilha! Que poético!". Sem hesitar peguei aquele sapato abandonado pensando em fazer uma instalação com ele. Todos pararam, começaram a rir e comentar "ainda bem que ela não bebe, rsssss". Tudo bem, eu continuo até hoje encantada com cada sapato que encontro abandonado na rua- e são vários...
Essa foto é uma experiência desta pesquisa e, por coincidência, também encontrado numa madrugada no Bexiga agora recentemente.




 ...

Olha o sapato no chão
onde andará esse pé...
no céu o brilho da noite
a rua cheia de bar
o pé, o chão.
o sapato na rua,
o olho na lua.
                              Claudia Colagrande

domingo, 1 de abril de 2012

DESDOENDO

Uma amiga do FB publicou uma palavra muito interessante "desdoendo"! Ana Cristina Martins me inspirou tanto com esta palavra que há 3 dias me pus a pensar nos "des" da vida; e são muitos, e tantos como : descolagem, despertar, despontar, despejar, desapego, deslocado, desencorajar, destoar, desbotar, desavesso, enfim poderia passar horas aqui buscando palavras desafiando o desejo de encontra-las. Mas desdoendo... essa eu nunca havia ouvido, lido nem pensado. E foi por isso que fiquei instigada a escrever algo que desconstruisse o pensamento mecânico de repetir palavras já prontas, tentando brincar com as palavras usando-as de forma criativa. O que surgiu deste ensaio reflexivo foi o seguinte:   

Procuro desfalar e desver
Despercorrendo o descaminho
Iniciando o despercurso
Lentamente desdoendo...
Claudia Colagrande, outono 2012

O que foi arrebatador foi a motivação que me levou a encontrar palavras que pudessem fazer sentido onde não há. Como o caminho que nunca foi percorrido, o sonho que nunca foi sonhado, a emoção que ainda não foi descoberta. Assim vou tecendo a vida buscando dar um dessentido a ela já que muitas vezes parece não haver nenhum. Desdoendo é muito bom! Ainda não é sem dor mas o desejo do por vir.
E vou desdomingando com a foto da Nina que clicou a pomba desvoando, boa noite!